A
constituição de 1988 traz em suas diretrizes um artigo onde deixa
claro que qualquer candidato à um cargo público precisa ter
precedentes positivos ao longo de sua vida. O 9° parágrafo do
artigo 14, sobre Direitos Públicos, considera ilegível candidatos
que possam abusar do poder ou colocar em risco a moralidade do
serviço público, ou seja, o cidadão que durante sua vida cometer
algum ato considerado ilegal perante a nossa constituição não tem
o direito de se candidatar a nenhum cargo que represente a sociedade:
vereador, deputado, senador, prefeito, governador ou presidente,
nada. A mobilização pela implementação da Lei Ficha Limpa foi
apenas um ato público onde os cidadãos brasileiros pediam respeito
pelo artigo 14.
De
acordo com Márlon Reis:
Muito mais do que uma lei eleitoral conquistada numa
memorável mobilização popular, a Ficha Limpa (Lei Complementar nº
135/2010) é a demonstração de que mudanças sérias podem ocorrer
por via pacífica e organizada. (p. 91)
Em apenas dois ano, o Movimento
de Combate à Corrupção Eleitoral (MCCE) consegui ultrapassar o
mínimo de assinaturas exigido para a Câmara dos Deputados votar uma
proposta de lei: mais de 1,6 milhões de assinaturas contra a eleição
de “pessoas contra as quais pairem condenações criminais”. (p.
92). Vale lembrar que além do óbvio que os brasileiros estão
cansados de tanta corrupção, a iniciativa teve grande auxílio para
o sucesso por utilizar a comunicação virtual como recolhedora de
adeptos ao abaixo assinado.
Após alcançar o mínimo de 1%
da população nacional a favor do Ficha Limpa e antes de ir à
votação, o texto foi alterado, como explica o autor:
Para facilitar a aprovação da matéria, concordou-se
em deixar explicitado no texto que ações penais privadas ou ações
penais públicas relativas a crimes culposos ou de menor potencial
ofensivo não seriam capazes de originar o afastamento de
candidaturas. (p. 93)
Antes de votadas, as propostas
do Ficha Limpa foram modificadas no intuito de limitar
percentualmente os casos de inelegibilidade. Crimes considerados “não
tão graves” não impedirão candidaturas, ou seja, a lei contradiz
o texto da Constituição, onde são inelegíveis pessoas que
cometerem qualquer infração judicial. Enfim, em Setembro de 2009 a
Lei Ficha Limpa foi votada em plenária e aprovada com 388 votos.
Dentre os 513 deputados em exercício de mandato, apenas 390 estavam
presentes e apenas 1 deputado votou contra, mas com vergonha, disse
que apertou o botão errado. O outro voto era do presidente da câmara
que estava impedido de votar, de acordo com Reis. Márlon também
destaca que após a aprovação da lei ainda foram votados 15
destaques que poderiam descaracterizar o projeto, porém foram todos
negados.
Vitoriosamente a iniciativa
popular foi promulgada e sancionada pelo presidente em Junho de 2010,
três anos após seus primeiros passos. A Lei 135/2010 garante que o
candidato que se comportar ilegalmente será proibido de tentar ser
eleito durante oito anos. Não soluciona os casos de corrupção no
país, mas qualquer mudança social precisa ter um princípio.
Resenha: Ficha Limpa: as lições
de uma mobilização histórica
in: Reis, Márlon. O combate
à corrupção nas Prefeituras do Brasil, Amigos Associados de
Ribeirão Bonito - AMARRIBO – 5. ed. - São Paulo: 24X7 Cultural,
2012 (cartilha)