quinta-feira, 15 de março de 2012

O Menino Contador



No início da última década de 60, um grupo de americanos mobilizou “por debaixo dos panos” uma revolução contra o pré-conceito racial. O líder, Martin Luther King, ao relatar o acontecido em seu livro Não Podemos Esperar, descreve detalhadamente como organizou um exército-sem-armas mostrando aos cidadãos americanos que uma luta não necessita de violência, mas de convicção.

No fim dos comícios, eu, Albernathy ou Shuttlesworth fazíamos um apelo aos voluntários para servirem no nosso exército não-violento.  [...], persuadimos os voluntários a se desfazerem de qualquer arma que estivesse em seu poder. Centenas de pessoas acudiram a este apelo. [...]
Provamos-lhes que não necessitávamos de armas – nem mesmo de um palito. Demonstramos-lhes que possuíamos a mais formidável de todas as armas – a convicção em que nos baseávamos. [...] Pessoas se apresentavam às dezenas para participar de nosso exército. [...]
Era um exército que se locomoveria sem causar dano. Um exército que cantaria, mas não mataria. Um exército que defenderia, mas não fraudaria nada. Exército para atacar os baluartes do ódio, para cercar os fortes da segregação, sitiar os símbolos da discriminação. (p.62-63)

Aconteceu que os discursos do Movimento Negro nos Estados Unidos tomaram grande proporção e modificaram a realidade social do país.  Sendo que toda esta movimentação ocorreu sem o uso de violência – por parte dos manifestantes, pois estes sofreram represálias e agressões físicas dos que insistiam em segregar a população por cor de pele.
Muito tempo se passou, mas em diversos pontos do mundo ainda existem segregações sociais que incomodam o olhar do bom. Vivemos em uma realidade capitalista que exclui aqueles que não conseguem acompanhar a sede de consumo e a imposição de valores financeiros sobre tudo: objetos, pessoas e desejos.
Quando finalmente decidi ser aluna de Pedagogia, já estava em meu limite de insatisfação em como as relações sociais vem se desenvolvendo dentro de diversas comunidades. Parti do princípio que para ver a diferença, tinha que começar mudando meu interior. Me envolvi apaixonadamente pelas teorias pedagógicas e aos poucos estou aprendendo a levar essas mudanças para a prática.
Passei dois anos acompanhando uma turma inesquecível de 23 crianças de 2 até 4 anos. Mudou minha vida, mudou minha maneira de olhar o outro, mudou a intensidade da responsabilidade que eu iria ter com minha vida dali em diante. Ao definir que lidaria com crianças como opção de trabalho - sendo ele voluntário ou remunerado, passei a ter consciência que RESPONSABILIDADE é o meu motor. 
Esta palavra deve ser o que faz o meu, o seu, o nosso mundo girar, pois a responsabilidade começa dentro de nós mesmos, somos responsáveis por aquilo e aqueles que cativamos. As crianças depositam suas expectativas de felicidade no trabalho que ofereceremos a elas. Essas expectativas só serão preenchidas com base na nossa responsabilidade perante este trabalho!
Caminhando neste ideal, tenho me deparado com diversas pessoas de coração equivalente ao meu, a cada dia que passa tenho mais provas que a utopia de uma sociedade mais justa pode se tornar real a medida que formamos laços de cooperatividade. Neste caminhar, encontrei um irmão, que me impulsiona a fazer isto acontecer: o Jam.
Jamerson Mancio (jamersongsa2012.blogspot.com) completa 31 anos hoje, com certeza de que sua passagem por aqui é de fazer o bem. Juntamos nossas ideologias e estamos colocando-as em prática. Estamos na expectativa para ele se tornar um Guerreiro Sem Armas, que assim como a turma de Luther King, vai a luta sem violência, mas com atitude:

O Guerreiros Sem Armas é um programa internacional de formação vivencial de jovens em liderança e empreendedorismo social, que são treinados em tecnologias para transformação de realidades em qualquer lugar do mundo. (http://www.guerreirossemarmas.net/)

Não acho que demorei pra encontrar o caminho do bem, cheguei na hora certa, na hora que sei que estou apta para assumir esta responsabilidade, preparada para enxergar nas diferenças o ânimo para luta.
No dia que resolvi arregaçar as mangas pra começar meu processo de mudança interior no intuito de mudar o exterior, encontrei o Jam, assim repentinamente, passando de carro, na correria do ganha pão dele, um trabalho ótimo, mas que não o fazia feliz. Quando ele me perguntou por que eu ia largar meu emprego naquele dia, tentei convencê-lo com uma única frase:
“A hora de mudar é o agora!

O post de hoje é uma homenagem ao aniversariante, que me inspira como Luther King e me abraça como irmão, pai, amigo destes que a gente não encontra por ai...

Leila Miana
Pesquisadora de Educação
15 de Março de 2012

quinta-feira, 1 de março de 2012

Formando adultos



Desde que o mundo é mundo, adulto é adulto e criança é criança. Certo? Não. O conceito de criança foi sendo elaborado através das modificações sociais que vivenciamos.
Dalla Vale, em seu livro Fundamentos da Educação Infantil (Fael, 2010) ressalta que “ao longo do séculos, as sociedades foram construindo formas de educar suas crianças” e assim de classificá-las perante a sociedade que estão inseridas. Ou seja, o conceito de infância vem sendo definido de acordo com o momento histórico em que é pesquisado, pois:

“Sabemos que a história da criança é registrada a partir do olhar dos adultos,pois a criança não pode registrar sua própria história. [...] A visão sobre a infância, atualmente, como um período específico pelo qual todos passam é uma construção definida no momento presente. A questão de que todos os indivíduos nascem bebês e serão crianças até um determinado período, independente da condição vivida, é inegável, entretanto, tal premissa nem sempre foi percebida dessa maneira e por diversos períodos se questionou qual era o tempo da infância e quem era a criança.” (Rocha, p.52)

Muitos classificam crianças por faixa etária ou fases de aproximação de interesses, contudo, até nos dias contemporâneos esbarramos nas dificuldades de realmente definir a infância.  
Aliás, o termo infância surge do francês “enfant” que significa “não falante”, sendo assim a criança é excluída do meio social, pois lhe é atribuído o adjetivo da incapacidade de se comunicar. A sociedade não engloba a criança como ser social que é, mas como um ser paralelo, onde em um mesmo mundo, vivemos dois: o Mundo dos Adultos e o Infantil.
As crianças passam a infância se modelando para a vida adulta, mas os adultos se esquecem disso e segregam a sociedade com padrões de comportamento para crianças diferenciados e excludentes do universo adulto. O erro mais comum no universo pedagógico é esta impossível segregação entre adultos e crianças, como se os pequenos não possuíssem vontades e atitudes, como se possível separar o passado do adulto do seu presente.
Simples assim: crianças não são diferentes do que adultos, são apenas o passado destes. Porque esquecemos disso? Esquecemos que é possível englobar o conceito de criança cotidianamente, que devemos lembrar e reforçar que estão inseridas no meio social.


Mas para desfazermos este mal entendido, algumas questões sociais devem ser repensadas e reformuladas. Partiremos então do ambiente mais influente no período de desenvolvimento de personalidade: escola.
A origem da palavra Educação (Educar + Ação) induz a modelar as atitudes dos indivíduos, ao longo do tempo criamos adultos incapazes de respeitar aos outros, como um irmão. O desvio de caráter dos futuros adultos ocorre quando não nos preocupamos em abordar as crianças como seres humanos em desenvolvimento.
A Educação contemporânea transforma sujeitos sociais em competidores entre si, que sempre disputam espaço e atenção em vez de focar no desenvolvimento do bem-comum.
Falta compreender o universo da criança como o ser que ela é, até mesmo professores e demais adultos do universo escolar, se esquecem que crianças são seres sociais em desenvolvimento. Esquecem que é a infância que vai moldar a vida adulta deste ser.
Lidando com a criança desta maneira, muitas vezes pensamos “é apenas uma criança, não entende isso ainda". Erro, pois crianças entendem e aprendem tudo, desde o primeiro estimulo que recebem em vida. Como diria Dorothy Law: “Crianças aprendem o que vivenciam.” Alias, #ficaadica ....
Os pequenos podem não responder e manter aquela cara blasé de que o mundo é completamente cor de rosa, mas dentro do seu pequeno arquivo-cérebro absorvem tudo que vivenciam e aos poucos demonstram não o que aprenderam ouvindo dos adultos, mas o que compreenderam do mundo que lhes foi apresentado por eles e no que é vivido por elas. 
Confio no poder do lúdico na formação de personalidade adulta, mas não segrego a criança do convívio humano. É na infância que aprendemos a socializar. Que devemos aprender a respeitar o próximo, enfrentar diversas dificuldades e como lidar com perdas e ganhos.

Leila Miana
01/03/2012
Oke arô! 



Fontes:
Fundamentos da Educação Infantil
Dalla Valle, Luciana de Luca – Curitiba: Editora Fael, 2010

HISTÓRIA DA INFÂNCIA: REFLEXÕES ACERCA DE ALGUMAS
CONCEPÇÕES CORRENTES
Rita de Cássia Luiz da Rocha
UNICENTRO, Guarapuava-Paraná

AS CRIANÇAS APRENDEM O QUE VIVENCIAM